Justiça determina a reversão ao município de Capinzal de todo o imóvel doado para empresa Qualimaq

 

O Poder Judiciário da Comarca de Capinzal, através de sentença exarada pela Dra. Karina Maliska, nos autos de Ação Civil Pública movida pelo Ministério Público de Santa Catarina, fez história no Município de Capinzal ao julgar procedente o pedido que determinou a nulidade da doação do bem imóvel com área de 5.000m² para a empresa Qualimaq – Industria e Comércio de Máquinas Ltda. O terreno está localizado no loteamento Colina, antiga Secretária de Infraestrutura, onde atualmente existem diversas salas comerciais, defronte ao Clube da Colina.

 

Trata-se do mais importante processo na Comarca envolvendo atos das antigas gestões municipais. O episódio é marcado por uma série de peculiaridades.

"Sabe-se que os órgãos públicos carecem de verbas para implementar os direitos básicos garantidos ao cidadão e, em uma situação como a descrita no presente feito, o ente municipal estava pagando para a utilização de um bem que anteriormente pertencia a ele – o que caracteriza verdadeira afronta ao interesse público. Conforme extrai-se do demonstrativo de cálculo, que segue com a presente, o Município de Capinzal, em 05 (cinco) anos desembolsou cerca de 1.000.000,00 (um milhão de reais) com o pagamento de aluguéis do imóvel doado".Trecho da sentença da ação civil pública n. 016.11.004122-2 da Comarca de Capinzal.

 

A empresa Qualimaq que recebeu em doação o imóvel através da indigitada Lei Municipal, havia sido criada rapidamente antes da edição da lei. A justificativa para doação de uma enorme gleba de terras avaliada hoje em milhões de reais na área urbana de Capinzal era a geração de modestas 10 (dez) vagas de empregos. A empresa, não cumpriu os termos da lei municipal, por não manter 10 funcionários por cinco anos e ainda ter cedido o imóvel para empresa Macro Trator.

 

 

O fato que mais salta aos olhos dá conta de que a empresa beneficiária, além de não cumprir a lei, fez diversas salas comerciais no local para captar alugueis. E nos três últimos mandatos, a Prefeitura locou parte do imóvel que era antes da própria Prefeitura para instalar a Secretaria municipal de Transportes e Obras. Isso ensejou o recebimento indevido de alugueis e causou um prejuízo aos cofres públicos, segundo a sentença, de quase R$ 1.600.000,00 (um milhão e seiscentos mil reais).

 

ENTENDA O CASO:

 

No ano de 1992, por meio da Lei Municipal 1.682, o Município de Capinzal realizou a doação do Lote nº 1, da Quadra 237, do Loteamento Colina, com área de 5.000m², na época avaliado em CR$ 15.000.000,00 (quinze milhões de cruzeiros), para a empresa Qualimaq – Indústria e Comércio de Máquinas Ltda. A referida lei estabeleceu três encargos para a doação do imóvel à citada empresa, a saber: a) a instalação da firma no prazo de 12 (doze) meses; b) a manutenção obrigatória de mais de 10 funcionários/empregos pelo prazo de 5 (cinco) anos; c) impossibilidade de transferência, cessão ou alienação do bem pelo prazo de 5 (cinco) anos. O descumprimento dos encargos estabelecidos importaria no retorno automático do imóvel doado ao Município de Capinzal (art. 3º da Lei). Posteriormente, foi editada outra Lei Municipal nº 1.742/93 que autorizou a empresa beneficiária ainda a dar o imóvel recebido do poder público em hipoteca ao Banco do Brasil.

 

Segundo narra a sentença, a empresa Qualimaq construiu no imóvel várias salas comerciais, locando-as inclusive para as empresas Perdigão AgroIndústrial S.A. e Fruti Agropecuária Barison Ltda. Em 07/01/1997, transferiu, a título de locação, o terreno doado, juntamente com as benfeitorias, à ré Macro Trator Ltda.

 

Posteriormente, em 21/05/2001, a empresa Macro Trator Ltda. locou uma das salas comerciais para a Prefeitura de Capinzal, para fins de instalação da Secretaria Municipal de Transportes e Obras.

 

A apuração dos desvios de finalidade iniciaram em 2008 com o ingresso em juízo de uma ação popular promovida pelo ex-vereador Rogério Biazotto.

 

Em 2011 o Ministério Público da Comarca de Capinzal, através da Dra. Karla Bárdio Meirelles Menegotto, ingressou com a Ação Civil Pública que, dentre outros pedidos, pretendia a indisponibilidade do terreno doado e a reversão do imóvel ao Município. Argumentou o Ministério Público, que a empresa beneficiada não manteve o número mínimo de 10 (dez) funcionários no período estabelecido pela lei municipal, o que evidencia o desvio de finalidade da doação e, por consequência, a lesão ao patrimônio público.

 

Consta ainda da sentença e dos documentos do processo, que durante o último mandato, por ser o então assessor jurídico municipal à época impedido de atuar no processo, já que era ex-sócio de uma das empresas beneficiadas, a prefeitura contratou um advogado com dinheiro público, que ao invés de defender para que o bem voltasse para o Município de Capinzal por conta do descumprimento da lei, perdeu o prazo de contestação e defendia a "pseudo-legalidade" do ato de doação do imóvel.

 

A sentença judicial destacou "que no ano de 2001, ou seja, nem decorridos 10 (dez) anos da doação do imóvel, o próprio Município de Capinzal locou grande parte do imóvel, conforme contrato de fls. 1117/1120".

 

"Tal situação chega a ser absurda, pois o ente municipal efetua a doação de um terreno ao particular e, após, se torna locatário do mesmo imóvel, ou de parte dele.

 

Tal situação até hoje causa constrangimentos aos cidadãos capinzalenses. A imagem que se gerou é de uma situação de impunidade aos que atentam contra a moralidade pública, como no caso em tela. Os cidadãos decepcionaram-se com o comportamento dos agentes sentem-se impotentes e revoltados diante da situação, o que tende a aumentar o sentimento de desprestígio do ente público perante a comunidade, com inegáveis reflexos no recolhimento de tributos, e na preservação do patrimônio público, em razão do dispêndio irregular de recursos públicos", destacou a Magistrada Dra. Karina Maliska.

 

A sentença ainda condenou a empresa a ressarcir o erário em R$ 1.593.875,69 (um milhão quinhentos e noventa e três mil oitocentos e setenta e cinco reais e sessenta e nove centavos), referente ao dano patrimonal causado, além da condenação em danos morais coletivos em R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), "visto que a sociedade capinzalense restou extremamente abalada como tal ato imoral, além dos vultosos ganhos pelas empresas Qualimaq Indústria e Comércio de Máquinas Ltda. e Macro Trator Ltda. com o ato".

 

A ordem judicial ao final determinou a instauração de inquérito policial,reconheceu todas as ilegalidades e imoralidades apontadas e decretou a nulidade da doação do imóvel com a reversão imediata de posse ao Município de Capinzal, além da liberação dos valores dos aluguéis bloqueados.

 

O Prefeito Andevir Isganzella, atual chefe do Poder Executivo informou que tão logo assumiu a gestão municipal tratou de se empenhar para ter novamente o bem ao patrimônio municipal, a fim de evitar maiores prejuízos. Destacou que já esteve em reunião no Fórum de Justiça de Capinzal com o Promotor de Justiça Dr. Fernando Wiggers, que foi o responsável pela instrução do processo que culminou na decisão em prol da moralidade. E em sintonia com os poderes constituídos, Andevir se comprometeu com a Promotoria de Justiça e vai usar o valor dos alugueis bloqueados também para fazer no local uma creche,criando novas vagas no município, já que há uma enorme demanda.

 

O que se denota da decisão judicial em fatos como os ora noticiados, é que coincide a sentença com a vontade popular de fazer valer a justiça nas atitudes que causam prejuízos ao erário. Prova disso são os recentes movimentos sociais, como até então vem sendo presenciados pela sociedade, que pedem um "basta" na corrupção e buscam as melhorias na saúde e educação.